Restituído após dois anos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e empossado nesta quinta-feira (23), o Comitê Gestor do Cais do Valongo faz ainda hoje sua primeira reunião. A pauta tem duas prioridades: a restauração e preservação do sítio arqueológico e a reforma do prédio das Docas, que fica em frente ao sítio arqueológico Cais, na região central da cidade do Rio de Janeiro.
No prédio, que hoje está em situação de abandono e sem luz, a ideia, segundo um dos integrantes do Comitê, o professor de História e conselheiro do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas, Ivanir dos Santos, é implantar o Centro de Referência da Celebração da Herança Africana. A proposta é criar um centro de acolhimento turístico e espaço de reflexão sobre a importância do legado do povo afrodescendente na cultura das Américas.
“Você não tem um centro de memória, de história e de cultura desta matriz cultural. E é isso que nós esperamos que seja contada. Não só a questão da escravidão, que é um episódio triste, mas importante na história, mas também o que que foi durante a escravidão: as resistências que houveram, as contribuições que houveram. Também tinham africanos não-escravos no Brasil e pouca gente sabe disso. Então, a memória social da escravidão tem que ser contada não só pelos senhores de escravos, mas por aqueles que vieram desses grupos”.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, que participa do comitê interministerial responsável pela execução dos projetos, disse que a restituição do Comitê Gestor do Cais do Valongo é um marco de ressignificação da memória e reforçou o compromisso de seu ministério para a concretização dos projetos.
No mesmo tom de Anielle Franco, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, disse que esse é o momento de respeito e de reconhecimento do legado que os povos escravizados deixaram.
“Nós estamos aqui, filhos destes que sobreviveram, e buscando esta justiça, esta recomposição, o reconhecimento deste lugar. Reconhecer a grande colaboração, o grande legado trazido pelos povos africanos, pela raça negra, na construção deste país”.
E, para traduzir a imagem desse momento, ela cantou Massemba, de Roberto Mendes e Capinã.
“Quem me pariu foi o ventre de um navio / Quem me ouviu foi o vento no vazio / Do ventre escuro de um porão / Vou baixar no seu terreiro / Êpa raio, machado e trovão / Êpa justiça de guerreiro / Ê semba ê ê samba ah / Ê céu que cobriu nas noites de frio / Minha solidão”
O comitê é formado por representantes de15 instituições da sociedade civil e de 16 entidades dos governos federal, estadual e do município do Rio de Janeiro e seu funcionamento é uma das exigências da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), para manter o título de Patrimônio Mundial ao sítio arqueológico, reconhecido em 2017.
“Vou aprender a ler / Pra ensinar meus camaradas / Vou aprender a ler / Pra ensinar meus camaradas”.