Com a apresentação do parecer do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto de lei conhecido como PL das fake news, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deve pedir urgência para pôr a proposta na pauta de votações do plenário, a fim de que o texto seja votado mais rapidamente. A previsão é que o plenário da Casa vote a urgência e o mérito do projeto de combate às notícias falsas e a regulamentação das redes sociais nesta quarta-feira (26).
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Orlando Silva defendeu a urgência do projeto. “O PL 2630 valoriza a liberdade de expressão, traz mais transparência à forma de atuação das plataformas, seus algoritmos e termos de uso, além de garantir direitos aos usuários”, afirmou. O parlamentar deve apresentar o parecer sobre a proposta nesta terça-feira (25) durante reunião de líderes dos partidos com Lira.
Mais cedo, a base do governo se reuniu na Câmara para discutir o projeto, com o objetivo de defender a tramitação rápida da proposta. “Debatemos o PL das fake news com a presença do relator. Precisamos unir o país na luta contra a desinformação, a barbárie e os discursos de ódio”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
Após a reunião com líderes, Lira deve se reunir com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes para tratar do assunto. Moraes deve fazer sugestões ao texto ao presidente da Câmara e ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O encontro está marcado para as 15h45 desta terça, no Senado.
Texto do PL das fake news
O texto da proposta trata, por exemplo, de responsabilização, transparência, monetização e impulsionamento de conteúdo. Na prática, a proposta amplia a lista de conteúdos que devem ser retirados do ar antes de uma determinação judicial.
O documento também estabelece o conceito para contas identificadas e que simulam a identidade de outra pessoa para enganar o público, rede de distribuição artificial e conta gerenciada por robôs, além da definição a respeito do encaminhamento em massa de mensagens.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública já enviou ao Congresso sugestões ao texto, que foram entregues ao relator do projeto. A ideia do governo federal, que tem interesse no assunto, é aproveitar o projeto das fake news para aprovar a regulamentação mais rapidamente.
Segundo o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, o diálogo do governo com o Congresso para tratar desse assunto está aberto e espera-se uma rápida aprovação.
“Precisamos de uma solução definitiva para que o que é proibido na vida real não seja permitido na vida virtual. O Congresso tem de se inspirar nisso. Acredito que o relator esteja se inspirando nisso para o relatório. Projeto importante para que situações como essa relacionada diretamente aos atentados nas escolas e os ataques como os de 8 de janeiro não se perpetuem em nosso país”, afirmou.
Responsabilidade de provedores
O texto trata ainda das responsabilidades dos provedores. O coordenador Henrique Faulhaber ressalta que a proposta não pretende censurar as redes sociais. “Em um assunto que envolve opinião, não se pode deixar a critério das empresas tirar do ar aquilo que elas acham que podem dar multa e, com isso, criar censura”, afirmou.
A proposta prevê, ainda, a criação de um Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, composto de 21 conselheiros — entre eles representantes do Legislativo, do Conselho Nacional de Justiça, do Comitê Gestor da Internet no Brasil e da sociedade civil.
Remuneração do conteúdo jornalístico
A falta de regulamentação das big techs, empresas responsáveis por redes sociais e buscadores, tem sido motivo de discussão em todo o mundo, e no Brasil o tema é tratado no PL das fake news. A proposta é que essas companhias paguem pelos conteúdos jornalísticos que publicarem, como já ocorre na Austrália.
Em entrevista ao R7, Orlando Silva disse que a legislação é importante para promover a valorização do jornalismo profissional na era digital. “O jornalismo é, inclusive, utilizado para dar tráfego às redes sociais, aos buscadores, e é por isso que eu acredito que, quando há conteúdo jornalístico indexado, publicado em redes sociais e buscadores, é necessário que haja uma remuneração por esse trabalho.”
O parlamentar citou os debates que ocorrem no mundo com o intuito de encontrar um equilíbrio entre a sustentabilidade da imprensa e a das big techs. A Austrália foi pioneira em relação à aprovação de uma regulamentação sobre o tema. Há dois anos, entrou em vigor no país o Código de Negociação da Mídia.
Essa lei australiana prevê que as empresas remunerem os produtores dos conteúdos distribuídos nas plataformas a partir de um acordo feito entre as partes. O governo entra somente quando não há consenso — o que, até o momento, não ocorreu.
Com a entrada em vigor da legislação, empresas jornalísticas do país obtiveram mais de US$ 200 milhões por ano do Google e do Facebook, segundo artigo publicado pelo professor da Australian National University. O modelo tem servido como inspiração para outros países, como o Canadá. A expectativa é que o Parlamento canadense vote a regra ainda neste ano. Índia, Indonésia, Espanha e Estados Unidos também discutem modelos de regulamentação.
Pensar em uma compensação financeira para os produtores de conteúdo por parte das plataformas é tido por especialistas como fundamental para resgatar o papel do jornalismo na democracia. A legislação australiana foi elaborada levando isso em consideração, mas houve impasses.
Pesquisador sênior do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS), João Victor Archegas destaca que o Facebook, por exemplo, argumentou que não tem nenhuma contrapartida significativa por disponibilizar conteúdos jornalísticos na plataforma. Por isso, em razão da nova lei australiana, falou em suspender a possibilidade de compartilhamento desse material na rede social.
“Em um primeiro momento, portanto, a regulação acabou tendo um efeito adverso. A situação na Austrália só se encaminhou para uma solução quando as plataformas e o governo chegaram a um acordo, de que essa questão seria resolvida por meio de negociações em uma espécie de câmara arbitral”, contextualizou Archegas, lembrando que o modelo permitiu os acordos bilaterais entre as partes.
Archegas advertiu que o PL das fake news precisa alinhar o entendimento entre as partes para evitar o efeito reverso, como ocorreu no início das discussões australianas.
Para Leonardo Lazzarotto, especialista em propaganda e marketing, o importante é encontrar um equilíbrio, sobretudo ao olhar para a distribuição da publicidade digital. Ele disse que somente Google e Facebook concentram 81% do investimento publicitário digital no mundo.
“O desafio desses novos tempos é encontrar um equilíbrio para que a imprensa continue exercendo seu indispensável papel, com receita suficiente para manter o negócio, com a participação das big techs e de todas as suas soluções digitais para a sociedade”, completou Lazzarotto.