Desde o início da atual legislatura, o Congresso Nacional recebeu requerimentos para a abertura de ao menos dez Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). O instrumento próprio do Legislativo serve para fiscalizar a administração pública e tem poderes de investigação equiparados aos das autoridades judiciais, como determinar diligências, ouvir indiciados, interrogar testemunhas, entre outros.
Para que as CPIs possam ser instaladas, é necessário cumprir algumas etapas:
• primeiro, os parlamentares têm de determinar um fato a ser apurado, o número de membros, o prazo de duração da comissão e o limite das despesas a serem realizadas;
• em seguida, eles precisam conseguir as assinaturas de um terço dos colegas (27 no Senado e 171 na Câmara dos Deputados);
• na sequência, cabe ao presidente da respectiva casa ler o requerimento da CPI no plenário.
A maioria dos pedidos de instauração de CPI quer investigar os atos ocorridos em 8 de janeiro deste ano, quando os prédios do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF) foram invadidos e depredados por vândalos. Há iniciativas tanto na Câmara quanto no Senado para que o colegiado seja criado.
Um dos primeiros requerimentos foi entregue pela senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS). A parlamentar quer a criação de CPI para apurar a responsabilidade pelos atos antidemocráticos, eventuais omissões cometidas por administradores públicos federais, estaduais e municipais no controle da segurança e a existência de financiadores e difusores desse e de outros movimentos semelhantes.
Ela recolheu mais do que as 27 assinaturas mínimas exigidas pelo regimento interno da casa para que o pedido fosse apresentado. A única etapa que falta para a criação da comissão é a leitura do requerimento pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o que não aconteceu passados dois meses dos ataques. Diante da demora, Soraya pediu ao STF que Pacheco seja obrigado a instalar a CPI.
Ao menos outros dois pedidos buscam a abertura de uma comissão para investigar os episódios de 8 de janeiro. Um deles foi elaborado pelo deputado Evair de Melo (PP-ES), que quer apurar as responsabilidades do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, visto que ele teria sido informado previamente da possibilidade de manifestações violentas e ainda assim não impediu os atos.
Já o deputado André Fernandes (PL-CE) solicitou a abertura de uma CPI mista, com a participação de deputados e senadores. Ele também afirma que o Executivo teria sido avisado antecipadamente de que os episódios de violência poderiam acontecer e que isso precisa ser analisado.
Crise yanomami e MST
Outro alvo dos pedidos de CPI dos parlamentares é a crise humanitária no território yanomami, em Roraima, que está sob estado de emergência em saúde pública após uma série de mortes de indígenas causadas por desnutrição e desidratação.
O deputado Dorinaldo Malafaia (PDT-AP) solicitou a abertura do colegiado para investigar as condutas comissivas e omissivas de agentes públicos de órgãos do Executivo federal no território entre janeiro de 2019 e dezembro de 2022.
O deputado José Nelto (PP-GO) também entregou um requerimento para a criação de uma CPI para investigar o caso “diante dos fortes indícios de violação do núcleo essencial dos direitos fundamentais à vida, à saúde e à segurança dos povos indígenas”.
Já o deputado tenente-coronel Zucco (Republicanos-RS) pediu a abertura de CPI para apurar as ações e invasões recentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST). Segundo ele, o objetivo da comissão é investigar os atos do movimento em locais com produção ativa. Na semana passada, por exemplo, três fazendas da produtora de papel e celulose Suzano foram invadidas pelo MST na Bahia.
O deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP) também entregou um requerimento de CPI do MST. “É preciso frear as ações criminosas do MST e apurar as responsabilidades pela invasão, bem como aferir se todas as autoridades agiram de acordo com a lei ou foram lenientes a fim de privilegiar o movimento.”
Ativismo judicial, joias sauditas e Americanas
O deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) tem buscado a abertura de uma CPI para investigar eventuais abusos de autoridade por parte de ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No ano passado, ele tinha apresentado o pedido de instalação do colegiado. Contudo, a comissão não foi aberta por não haver tempo hábil.
Entretanto, ele retomou o pleito neste ano. Segundo o deputado, “nos últimos meses, foram inúmeras as violações de direitos e garantias individuais contra cidadãos brasileiros, políticos e também contra pessoas jurídicas, perpetradas por ministros das cortes superiores, justamente aqueles que teriam o dever de garantir o pleno exercício desses direitos e não de violá-los”.
Há ainda um requerimento de CPI para o episódio das joias apreendidas pela Receita Federal que seriam um presente do governo da Arábia Saudita para o governo brasileiro durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Outro pedido quer a instalação de um colegiado para investigar o caso das Lojas Americanas, que está em recuperação judicial após ter revelado em janeiro um rombo contábil de R$ 20 bilhões.